Um exército? Mas ele não precisa de um exército além do Varapau, do burro e do cão. O varapau varre um feira, tão eficazmente como um canhão krupp.

“As alegres canções do norte” Alberto Pimentel (1905)

Conspiradores Monárquicos de varapau

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“Photografia de alguns valentes portugueses, pertencentes à coluna(…) do glorioso nome portugues. Viva D. Manuel II”
-Ilustração Portuguesa N338 – 12 Agosto 1912
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-Acontecimentos no ano de 1911
Noticiavam os jornais que, em Felgueiras, magotes de indivíduos empunhando espingardas, foices e varapaus entoaram «vivas» à Monarquia e a Paiva Couceiro, seguidos de «morras» à República, e hastearam a bandeira azul e branca na Câmara Municipal.
-Fonte:Douro press-As incursões dos “couceiristas” no Minho e Trás-os-Montes Por Manuel Dias, jornalista e escritor
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Apesar de se encontrarem suspensas as garantias individuais e ter sido declarado o estado de sítio em 13 de Dezembro de 1916, na sequência da tentativa de golpe liderada por Machado Santos, os monárquicos da Mamarrosa, armados de varapaus e espingardas, eram acusados de, na noite de 1 para 2 de Janeiro de 1917, insultar os republicanos e soltar “avinhados vivas à monarquia”. O instigador-mor era mais uma vez Armando Simões Gapo, “ridículo galopim às ordens do chefe monárquico Sereno de Bustos”

A pretexto do 9 de Maio de 1920: achegas para o ambiente em que se gerou a freguesia de Bustos – Carlos Braga – 2010
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Grupo de «Trauliteiros»

monárquicos revoltosos que assolaram o norte do país durante a intentona monárquica de 1919 (a “Monarquia do Norte”). Fotografados no exílio em Espanha (a fotografia foi cedida à “Ilustração Portuguesa” por Luiz Derouet). 03 FEV. 1919.

Fundo: AMS – Arquivo Mário Soares – Fotografias Exposição Permanente
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“A grande maioria dos soldados deste exército improvisado era constituída por civis e eclesiásticos, alheios à organização militar e desprovidos de treino específico. Na sua preparação para combate, na ausência de armamento e de espaços adequados, recorria-se a exercícios feitos «com paus», quantas vezes realizados nos quartos ou corredores das casas que os hospedavam. A maioria dos «combatentes» aliciados, simples trabalhadores agrícolas e rurais e alguns criados, deixara-se guiar pelas promessas de proventos financeiros e de uma vida mais desafogada.”

“Antiliberalismo e contra-revolução na I República (1910-1919)” Miguel António Dias Santos – Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra
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Rixa de varapau nos franceses

Queixas se tinham feito ao general Thomiers, de que os moradores das Caldas e das terras circunvizinhas não tratavam bem os seus soldados, de que resultou mandar ele para ali alguns de gradadeiros do regimento nº58. No dia 27 de Janeiro de 1808 altivos passeavam estes soldados pela praça e ruas da vila, quando uma chufa dita por um homem do povo levou um dos tais granadeiros a puxar pela espada contra ele.

Acolhido o homem em casa de sua mãe por uma sua irmã, que por fóra fechara a porta á chave, de prompto foi arrombada pelos franceses, que sem respeito algum ao sexo, apalparam violentamente a rapariga por onde muito bem lhes pareceu, a pretexto de lhe tirarem a chave.

Aos gritos da victima acudiu um cadete do segundo regimento do Porto (18 de infanteria), que lançando mão a um pau, com ele investiu os soldados franceses. Este exemplo de resolução foi logo seguido por outros individuos do mesmo regimento, de que resultou serem feridos dois ou tres dos agressores, e ficar a dita rapariga com os peitos todos negros e contusos das pancadas que um deles lhe tinha dado com o punho da espada.
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“Historia da guerra civil e do estabelecimento do governo parlamentar em Portugal. Segunda Época, Guerra da Peninsula, Tomo I” – Simão José da Luz Soriano (1870)
 

Namoro Saloio.

“Alevante-me êsses olhos
Por baixo dessas pestanas,
Que eu quero conhecer bem
As luzes com que me enganas”

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Cantiga popular da região saloia:

“Sou saloio, honro-me disso
Pra casacas não sou mau
Os janotas atrevidos
Sei correr a varapau.

Ó saloia dá-me um beijo
Que estou morrendo à fome
O beijo de uma saloia
É o sustento de um Home.”

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A saloia, quando ama, é tímida e vergonhosa; pelo menor dito se faz vermelha; e o saloio, quando diz finezas, está sempre cabisbaizo, escrevendo no chão com o varapau; e cada vez que abre a boca é para deixar sair torrentes de poesia.
-“Revista popular: semanario de litteratura, sciencia, e industria, Volume 5”- 1852

Pau-de-marmelêro – «Cajado ou varapau que os rapazes casadoiros usavam antigamente quando iam namorar, como espécie de insígnia ou sinal distintivo» – Costa 1957 [Murteira]

Uma procissão atribulada

O andor tinha três laços, e representava a torre de Agarêz. Bofetada dos de Donelo aos brios do povo, por causa dum relógio que já fez a infelicidade de muita gente. Apesar de milhentos peditórios e rifas a seu favor, nunca chegou a ser comprado. Daí a polvorosa que se levantava sempre que alguém mexe na ferida. E o prepósito era precisamente esse: acirrar. Muito em segredo, a bisarma foi armada lá na terra, e S. Brás metido no sítio do mostrador. Francamente!

A procissão sai da igreja às dez e meia, e atravessa Agarez antes de meter pela serra acima a caminho da ermida. Mas em vez de se apresentarem a horas devidas, como os demais, não senhor: só quando ela passava em frente do cruzeiro, é que os de Donelo deram o sinal de vida.

Roberto, assim que ouviu estoirar os morteiros anunciadores daquela chegada provocadora, correu perto do palio a saber ordens do Manuel da Tia, principal mordoma, que pagava uma das varas.

– Aí vêm eles… – disse.

– Deixa-os vir… – respondeu o outro, a enxugar a testa. – Não se lhes liga importância… Que sigam atrás, se quiserem. E, conforme cantarem, dançamos nós…

– Calma! – Recomendou o senhor prior, que, entre dois acólitos – o padre Rego de Paços e o padre Capão de Covas – , levava o santo lenho encostado ao peito. 

Os de Donelo entraram pelo caminho velho. O andor, descomunal, bandeava que parecia um castanheiro em Novembro. Só por meio de cordas seguras por quatro homens evitava que tombasse.

O povo de fora, alheio ao acinte, olava a maravilha assombrado. Os de Agarêz mordiam-se de raiva.

A procissão ia andando. A música de Magueija, que revezava com a de Constantim, tocava o Queremos Deus. As zeladoras andavam numa fona para nos manterem na forma.

O encontro foi no Eiró. Como um odre – o vinho de Donelo é trepador – , o farsola do Rodrigo adiantou-se alguns passos dos companheiros e, sozinho no meio da estrada, ergueu as mãos e gritou:

– Pare a procissão!

O Animal do Jaloto, que levava o estandarte e abria o cortejo, titubeou, pousou o mastro, e ficou ali a mastigar em seco, lorpa de todo. As figuras foram estacando também, claro.

O Roberto que, entretanto, entrara na venda do Ti Faustino a molhar a garganta, quando voltou e deu com os olhos no patife a impedir o caminho, perdeu a cabeça. Dum salto, chegou-se ao do pendão e berrou-lhe:

– Ó meu filho da puta, quem te mandou parar?

– Eu! – fanfarronou o de Donelo.

– Anda para diante, cagão dos infernos! Tens medo dum chafedes daqueles?

– Pare a procissão! – teimou o outro. – Queremos entrar.

– Metam-se atrás, se quiserem.

– E por muito favor!

– Os cães é que andam à trela…

E armou-se a trovoada. Siga, não siga, torna que deixa, e ainda o Rodrigo ia a meter a mão no bolso a sacar da mauser, já tinha as tripas de fora.

Os de Donelo, mal viram cair o de lá, ficaram cegos: ergueram os varapaus e começaram a eito.

Gritaria, correrias, as varas do pálio transformadas em estadulhos, e o próprio padre Capão, de pistola em punho, a defender a pele e a meter os mais assanhados na ordem.

Não morreu ninguém, felizmente, mas chegou para afligir. S. Brás ficou sem um braço, e Santa Ana, que vinha no andor de Arca esquadrilhada de todo. O Chichanas, tal mocada levou na cabeça, que teve de ser trepanado. Nunca mais regulou bem.

A procissão continuou, embora desmantelada, e tudo correu normalmente, a seguir…”

— O Terceiro Dia da Criação do Mundo – Miguel Torga

Nicolau e Venceslau

Uma história para crianças:

TODOS conheciam naquela terra o Nicolau e o Venceslau, dois homens nem moços nem velhos, nem altos nem baixos, nem bonitos nem feios, um gordo outro magro.

Ora o Nicolau tinha uma fazenda onde havia uma figueira, que dava belos figos moscateis. O Venceslau foi lá um dia, trepou à figueira, apanhou muitas dúzias de figos e meteu uns para a barriga e outros para as algibeiras.

Deu por isso o Nicolau e protestou que havia de arranjar um varapau para dar uma sova no Venceslau, que era ratoneiro e marau.

Foi ter com um marmeleiro que havia na fazenda, e o marmeleiro disse-lhe:

-Como estás tu, ó Nicolau?

E o Nicolau respondeu-lhe

-Estou bom e quero um dos teus ramos, para arranjar um varapau, para dar uma sova no Venceslau, que é ratoneiro e marau.

E o marmeleiro respondeu-lhe:

-Se queres um dos meus ramos, arranja um machado para me cortares.

O Nicolau foi ter com um machado, e o machado disse-lhe:

-Como estás tu, ó Nicolau?

E o Nicolau respondeu-lhe:

-Estou Bom e quero que cortes um ramo de marmeleiro, para arranjar um varapau, para dar uma sova no Venceslau, que é ratoneiro e marau.

E o machado respondeu-lhe:

-Se queres que eu corte o marmeleiro, arranja uma pedra para me afiares.

O Nicolau foi ter com a pedra e a pedra disse-lhe:

-Como estás tu,ó Nicolau?

E o Nicolau respondeu:

-Estou bom e quero que afies o machado, para cortar o marmeleiro, para arranjar um varapau, para dar uma sova no Venceslau, que é ratoneiro e marau.

E a pedra respondeu-lhe:

-Se queres que eu afie, arranja água para me molares.

O Nicolau foi ter com a água que havia no poço da fazenda, e a água disse-lhe lá de baixo:

-Como estás tu ó Nicolau?

E o Nicolau respondeu-lhe:

Estou bom e quero que molhes a pedra, para afiar o machado, para cortar o marmeleiro, para arranjar um varapau, para dar uma sova no Venceslau, que é ratoneiro e marau.

E a água respondeu-lhe:

-Se queres que eu molhe a pedra, arranja que a nora me leve lá para cima.

E o Nicolau foi ter com a nora, e a nora disse-lhe:

-Como estás tu, ó nicolau?

E o Nicolau respondeu-lhe:

-Estou bom e quero que levantes a água para molhar a pedra, para afiar o machado, para cortar o marmeleiro, para arranjar um varapau, para dar uma sova no Venceslau, que é ratoneiro e marau.

E a nora respondeu:

-Se queres que eu levante a água, arranja que o boi me faça andar.

O Nicolau foi ter com o boi, e o boi disse-lhe:

-Como estás tu, ó Nicolau?

E o Nicolau respondeu-lhe:

-Estou bom e quero que faças a nora andar, para levantar a água, para molhar a pedra, para afiar o machado, para cortar o marmeleiro, para arranjar um varapau, para dar uma sova no Venceslau, que é ratoneiro e marau.

E o boi, que era muito manso e obediente, fez andar a nora, e a nora levantou a água, e a água molhou a pedra, e a pedra afiou o machado, e o machado cortou o marmeleiro, e o Nicolau arranjou um varapau, com que deu uma sova no Venceslau, a quem chamou de ratoneiro e marau.

Mas como não era peco, o Venceslau tirou o varapau das mãos do Nicolau e deu-lhe um troco menos mau.

E assim ficaram ambos castigados: por furtar os figos o Venceslau e por ser vingativo o Nicolau.

Em “Serões” revista mensal ilustrada Nº8 – 1906

Avô ribatejano mestre de varapau

Ribatejano, o meu avô paterno gostava muito do rapaz que eu era e eu retribuía-lhe a amizade com cigarros Definitivos. Também levando-o aos espetáculos de luta livre no Parque Mayer. Ele gostava muito dos combates. Eu gostava mais da alegria e da raiva que os lutadores lhe davam. Ria-se e gritava. Levantava-se do lugar, empunhava a bengala, recordava as lutas da sua mocidade.

O meu avô foi mestre de varapau e por causa da sua jaqueta de alamares e calça afiambrada, teve que dar muita cacetada em fidalgotes arrogantes. Também gostava de tomar uns copos mas, diz o meu pai, por mais carregados que levasse os machinhos, nunca bateu em velhos, aleijadinhos ou dementes e nunca arrastou a asa a mulher casada.

Era um galhardo defensor dos fracos e numa daquelas noites de chuva e escuridão, depois de três litros de briol, até desafiou e fez uma espera ao Diabo que, temeroso, não apareceu na azinhaga do costume. Para a valentia do meu avô havia apenas duas qualidades de homens: os bons e os maus (os justos e os injustos, os leais e os traiçoeiros).
                                                                                                                                                         “MATA-CÃES” Fernando Correia da Silva

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Brandindo o varapau: |/||/||/||/||/||||/||/||/||//

Finalmente o jogo do pau tem um “emoticon”, elemento essencial à comunicação virtual, utilizado para fins menos formais.

No entanto esta expressão não pode apenas ser utilizada por praticantes ou conhecedores da arte, mas sim por qualquer pessoal que por uma razão ou por outra, nas suas conversações ou comunicações online, pode expressar a sua indignação ou simples necessidade de se exprimir brandindo o varapau!

Um “diabo” de varapau

Quem, vindo pela estrada a que hoje teremos de chamar “velha”, que ligava a Portelinha à Benfeita, tivesse atravessado a Dreia e transposto o ribeiro “de cima”, e deixasse à esquerda a “casa dos colhereiros” e, logo em seguida, na curva, as “alminhas” que convidavam o caminheiro a rezar pelos que penavam no Purgatório, entrava na pitoresca e tenebrosa “Barroca da Vinha”. Pitoresca porque a estrada marginava formoso soito de gigantescos castanheiros,cujas copas,de um verde claro e alegre, formavam fechado docel, que o Sol a custo rompia; tenebrosa porque o “Diabo”, segundo a tradição, escolhia aquele fresco e umbroso local para aparecer àqueles a quem queria tentar, ou meter medo. Raras seriam as pessoas que, de dia, atravessavam a “Barroca da Vinha” sem levarem o “Credo” na boca e a mão bem nervosamente apertada numa figa. E de noite… De noite, quem se atreveria a atravessar, sozinho, aqueles cinquenta ou sessenta metros de estrada?

Uma tarde, o Manuel “Maneta”, de regresso não sabemos de onde, demorara-se a conversar na Dreia, numa roda de amigos. Cavaqueava-se e bebia-se; “rodada” para por um, “rodada” oferecida por outro, e depois por um terceiro e um quarto, que não queria ficar de somenos. O Sol já havia desaparecido há muito e a noite começava de adensar-se.

– Manuel, são horas – disse alguém – olha que não há luar e a noite vai ser de breu. Daqui à Benfeita ainda é um bocado, e os caminhos estão maus.
– Ainda é cedo – respondeu o interpelado – e o escuro não me mete medo!
– Mas olha que pode aparecer-te o “Diabo” na “Barroca da Vinha” – insistiu o amigo, para pôr fim às “rodadas”.
– Pois até gostava que me aparecesse. Ao menos ia de companhia! – retorquiu o Manuel, com uma bela e sonora gargalhada.

A cavaqueira continuou ainda, mas a evocação do “Diabo” não deixou de impressionar os circunstantes, que, primeiro um, depois outro, foram indo para casa.

Às tantas, o “Maneta” despediu-se e, com uma bengalita de vareta de aço forrada de papel, que estava, então, na moda, meteu-se resolutamente ao caminho, assobiando. Desceu até à ribeira, subiu tornejando para a “casa dos colhereiros”, benzeu-se em frente às “alminhas” e entrou no túnel formado pelas copas dos castanheiros. A escuridão era ali completa, e profundo o silêncio da noite, só interrompido pelo estalar dos gravetos debaixo dos pés do viandante. Súbito, o “Maneta” ouviu uma voz, uma voz roufenha, medonha, pavorosa! Estacou, olhos dilatados! Ouvidos atentos, ansiosos! E a voz repetiu, arrastadamente:

– Ó Manuel, espera aí que eu também vou!

E, detrás de um castanheiro, que depois se ficou a chamar “do medo” ou “do Diabo”, surgiu um vulto branco, enorme, horrendo, a avançar para a estrada, brandindo um gigantesco e ameaçador varapau, prestes a deslombar o interpelado!

Nessa noite, o Manuel Martins chegou a casa muito mais cedo do que contava. Dir-se-ia que teve asas, ou que o seu anjo protector o ajudou a percorrer o resto do caminho! Porque o “Diabo” não foi, porque o “Diabo” ficou na “Barroca da Vinha”, pois não teve “pernas” para acompanhar o “Maneta” na corrida.

A verdade é que só muito tempo depois o “Maneta” acreditou que aquele vulto medonho, horrendo, alveiro, de voz cavernosa, escalafriante e varapau ameaçador, não fora senão o José Gomes que, cortando caminho pelos matos, lhe saíra à frente naquele preparo, disposto a abater-lhe a prosápia com duas boas arrochadas.

Nota: O soito existente na “Barroca da Vinha” desapareceu totalmente com a “malina” que em toda a região deu nos castanheiros. O local está hoje completamente diferente do que era quando ocorreu a aventura, verdadeira, que fica descrita, não só pela falta dos castanheiros que ensombravam o caminho e o tornavam tétrico de noite, mas também porque sobre este veio a construir-se a “estrada de macadame”.

As “alminhas”, porém, ainda estão no mesmo local, reparadas dos insultos do tempo e dos malefícios dos homens, graças ao generoso interesse e patrocínio do Sr.António Nunes Leitão.

José Gomes, o “Diabo” que saiu ao caminho do “Maneta”, era um homem alto, forte e valente, alfaiate de seu ofício que deixou boa fama de si.

Mário Mathias
A Comarca de Arganil – Agosto/1954
http://benfeita.net/histor15.htm

A Inês Negra

Esta história teve lugar em 1388, no início do reinado de D. João I, em que se travou uma guerra contra Castela pela independência de Portugal.

Esta contenda, em que sobressaíram os feitos do Condestável Nuno Álvares Pereira e de muitos nobres portugueses, dividiu a aristocracia e o povo português, tomando muitas terras o partido de Castela.

Foi durante esta guerra civil que a Inês Negra, uma mulher do povo fiel à causa portuguesa, abandonou Melgaço quando esta cidade se pôs ao lado do rei de Castela.Quando D. João I decidiu reconquistar Melgaço, Inês Negra juntou-se ao seu exército, mas as duas facções nunca chegaram a defrontar-se.

A batalha travou-se entre Inês Negra e uma sua inimiga de longa data, a “Arrenegada”, que tinha optado por apoiar os castelhanos. A lenda diz que a “Arrenegada” desafiou Inês Negra do alto das muralhas, propondo que a contenda fosse resolvida entre ambas com o acordo do exército castelhano. D. João I assistiu espantado à resposta de Inês Negra que dizia aceitar o desafio.

Ambos os exércitos concordaram com este duelo e a Inês Negra, de espada na mão, defrontou a sua inimiga apoiada pelos gritos de incitamento dos homens de D. João I.

O silêncio instalou-se quando a “Arrenegada” fez saltar com um golpe a espada das mãos de Inês, mas esta tirou uma forquilha da mão de um camponês e fez-se à luta, procurando atingir a “Arrenegada” nas pernas. Sentindo-se em desvantagem, esta atirou fora a espada e pegou num varapau que quebrou com fúria nas costas de Inês.

Louca de fúria e de dor, Inês Negra largou a forquilha e atirou-se com unhas e dentes à sua oponente, rolando ambas no chão empoeirado. Um grito de dor gelou a assistência, que não conseguia perceber qual das duas vencera.

Foi então que a “Arrenegada” se levantou e fugiu para o castelo, tapando as nódoas e o sangue do rosto com as mãos.

Os castelhanos abandonaram Melgaço no dia seguinte e D. João I quis recompensar a heroína, mas esta respondeu que estava plenamente recompensada pela sova que tinha dado à sua inimiga.